Yo-Yo
Ma

O músico
possui uma discografia com mais de 75 títulos, dos
quais 15 receberam o prêmio Grammy. Filho de chineses,
o artista nasceu em Paris.
A
comoção em torno de Yo-Yo Ma não se deve
apenas ao talento que o violoncelista radicado nos Estados
Unidos - tem, e de sobra. Ma é um dos poucos artistas
da música clássica a ter extravasado o mundinho
muitas vezes fechado do setor, alcançando fama universal,
vencendo prêmios como o Grammy, o Oscar e batendo recordes
de vendagens de disco (seu último álbum, Appassionato,
retrospectiva de sua carreira, está desde o lançamento
no topo da lista da Billboard). Yo-Yo Ma é uma grande
estrela. Sinais disso você tem já na hora de
tentar entrevistá-lo. As negociações
levam semanas, jornalistas precisam enviar currículo
com músicos já entrevistados. E, se passam pelo
crivo da Assessoria de Imprensa, ganham dez minutos de conversa.
Nada mais.
Mas
o Yo-Yo Ma do outro lado da linha nada tem a ver com uma superestrela.
Simpático, pede desculpas pelo atraso, vai um pouco
além dos dez minutos previstos. Sobre os recitais,
se diz entusiasmado. É um programa que lhe pareceu
bastante interessante, capaz de demonstrar diversas facetas
dos dois intérpretes, garante. E aí desata a
falar de Kathryn Stott. Os dois se conheceram em Londres,
nos anos 70, por acaso e em uma situação que
tinha tudo para ser constrangedora. Ma e sua mulher, Jill,
alugaram do violinista Nigel Kennedy um apartamento em Londres.
Chegaram à capital inglesa e descobriram que Stott
também estava na lista de inquilinos de Kennedy. Ambos
imaginavam que teriam o apartamento só para eles, mas
o constrangimento abriu espaço para o início
de uma relação próxima de amizade. E
desde então os dois têm se apresentado em todo
o mundo - Stott também aparece em algumas das gravações
de Ma, como a da Sonata do francês César Franck.
Música
brasileira
Em
seu site (www.yo-yoma.com),
o violoncelista descreve a arte de fazer música de
câmara como uma conversa. Então, uma vez no palco,
sobre o que ele e Stott gostam de falar? “O interessante
com ela é que não se trata de ter experiências
semelhantes ou concordar sobre o repertório. Isso é
secundário. O mais importante é que, quando
estamos juntos, não precisamos dar sinais um para o
outro, trocar olhares. Nossa conversa é antes de mais
nada instintiva. E Kathy tem um espírito aventureiro,
gosta de explorar repertórios, sonoridades, sem receios”,
diz.
Não
por acaso, ela participou dos dois discos que Yo-Yo Ma dedicou
à música brasileira, Obrigado Brazil! e Obrigado
Brazil Live in Concert, ambos com a presença de artistas
como os irmãos Assad e Luciana Souza. Em São
Paulo, os dois vão interpretar obras de Egberto Gismonti.
De onde vem o fascínio pela música brasileira?
“O choro, o samba, tudo no Brasil tem uma característica
que me agrada muito”, ele começa. “Há
algo na música de seu país que sugere união,
celebração. A música brasileira aproxima
as pessoas de um jeito muito interessante. Na Argentina, por
exemplo, me chama a atenção o aspecto melodramático
das composições. Aí, não importa
qual a emoção. A produção brasileira
reúne todas as sensações possíveis,
dor, amor, alegria, tristeza, enfim, talvez por isso consiga
dizer tanto a tanta gente, sempre.”
Ma
tem sempre buscado um repertório amplo. Já gravou
as principais peças para violoncelo, das suítes
de Bach a obras de autores do século 20, sem deixar
de lado o jazz, a música popular ou mesmo a produção
para cinema.

Legado
“Em
qualquer aspecto da atividade humana, o diálogo é
fundamental. Na música, ele é evidente. Acredito
que a principal dicotomia nos dias de hoje é entre
a novo e o velho. Mas acho que não há tradição
que não parta de invenção, da mesma forma
que o novo busca no passado suas razões. Estamos sempre
envolvidos no que aprendemos, nas lições dos
grandes mestres, e é daí que surge a inspiração
para que possamos dar novos passos.”
Grandes
mestres? Não dá para fugir da figura de Mstislav
Rostropovich, o grande intérprete do violoncelo morto
há cerca de um mês, aos 80 anos. Ma não
hesita. “Após sua morte, falou-se muito sobre
seu trabalho, sua importância, sempre se ressaltando
a quantidade de obras que ele encomendou a novos autores,
ampliando o repertório do instrumento. Mas sua contribuição
não foi apenas quantitativa. Ele foi um grande músico,
que expandiu as possibilidades técnicas do violoncelo.
Ao escrever para um artista tão talentoso, os compositores
puderam criar peças que mudaram nossa percepção
do instrumento. E fizeram com que as gerações
seguintes, e eu me incluo nesse grupo, tivessem que reinventar
o estudo, a técnica.”
E
qual legado Ma espera deixar para as próximas gerações?
Ele se recusa a dar uma resposta, acha difícil fazer
uma avaliação do próprio trabalho. Pode
falar apenas daquilo que guia sua atividade. “É
impossível, ao menos para mim, ter um feedback do que
tem sido meu trabalho, é algo que apenas o tempo pode
dizer. O que posso garantir é que a música vai
além de mim, sempre penso que a arte é maior
do que o intérprete, a quem resta a função
de resgatá-la sempre, pensando no contexto em que foi
criada e tentando criar relações com a nossa
época.”
Reuters
- João Luiz Sampaio / Estadão
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