"Laços
do Olhar"
As
conexões entre Brasil e Japão desde o século
19
''Já
foi o tempo que a cultura do Japão era diferente, hoje
o Brasil é nipônico'', defende Paulo Herkenhoff,
curador da exposição Laços do Olhar,
aberta ao público a partir de quarta (21) . No ano
em que se comemora o centenário da imigração
japonesa no Brasil, não faltam exposições
que exploram a relação entre os dois países,
mas Laços do Olhar tem o fôlego de adentrar em
campos ricos e variados do entrelaçamento das duas
culturas. ''Existe uma tendência na historiografia de
depositar os laços entre o Japão e o Brasil
apenas nos pintores japoneses. Acredito que gerações
mais novas queiram trocar essa idéia'', diz Herkenhoff,
que propõe com essa ampla exposição provar
que as duas culturas se entrelaçam em produções
artísticas de diversos gêneros, épocas
(do século 19 à contemporaneidade) e os criadores
de maneira muito mais profunda do que se imagina.
O japonismo
do século 19, ''resposta da Europa à abertura
do Japão'', como contextualiza Herkenhoff, teve também
na época seu reflexo no Brasil (mesmo antes de aqui
aportarem os primeiros imigrantes a bordo do navio Kasato
Maru, em 1908). O pintor Eliseu Visconti (1866-1944), por
exemplo, realizou em 1893 (antes de viver em Paris) a tela
Menina com Ventarola: Estudo de Nu, em que a figura feminina
segura o objeto japonês. Mas não apenas isso.
Visconti mesmo foi um colecionador de gravuras japonesas -
há várias de sua ampla coleção
na mostra - e estudou, como poucos, certos elementos da milenar
cultura para transpor para suas obras - como os desenhos de
movimentos de mãos das mulheres japonesas e de motivos
florais (dialogando com obras de Massao Okinaka) e lanternas
vermelhas.
Indo ainda
adiante, há um momento importante na exposição,
dedicado à questão da identidade. Na primeira
sala do instituto o curador reúne um conjunto de telas
de Anita Malfatti, artista do primeiro modernismo brasileiro.
Seus quadros O Japonês (1915/16) e O Homem Amarelo (da
mesma época) remetem à idéia ambígua
do ocidental pintando, de amarelo, o homem oriental. Ao mesmo
tempo, depois dessas obras, estão telas realizadas
a partir dos anos 1920 por artistas japoneses que no Brasil
aportaram. Neles se fazem presentes duas questões importantes:
a presença do auto-retrato como busca de deixar registrado
um nome e um rosto (destaque para o de Takaoka) e das paisagens,
o que remete à idéia de reconhecimento do novo
país em que os imigrantes vivem.
Mas o
curador optou por não estabelecer ''uma narrativa''
cronológica das relações artísticas
entre os dois países e sim explorar núcleos
em que ora os entrelaçamentos são mais nítidos,
ora mais sutis - o que também permite certos encontros
sob uma visão mais poética, como no segmento
que representa a relação geográfica e
cósmica entre os dois países (enquanto é
dia no Japão, é noite no Brasil), com obras
de Oscar Oiwa, Rego Monteiro e Naiah Mendonça.
De certa
maneira, então, a obra O Helicóptero (1969),
de Duke Lee (grande homenageado da mostra), raramente vista,
transforma-se em ícone de Laços do Olhar: a
instalação é formada por um painel contínuo
em espiral em que estão colocadas imagens num ''pot-pourri
internacional''. ''É como um vórtice, um movimento
imaginário em que as coisas são levadas, transformadas,
se encontram e se distanciam'', diz Herkenhoff.
De certa
maneira, então, a obra O Helicóptero (1969),
de Duke Lee (grande homenageado da mostra), raramente vista,
transforma-se em ícone de Laços do Olhar: a
instalação é formada por um painel contínuo
em espiral em que estão colocadas imagens num ''pot-pourri
internacional''. ''É como um vórtice, um movimento
imaginário em que as coisas são levadas, transformadas,
se encontram e se distanciam'', diz Herkenhoff.
Sincretismos
e correspondências vão, enfim, acontecendo por
meios diversos: na poesia (há os célebres haicais
de Haroldo de Campos ilustrados por Tomie Ohtake e obras do
poeta curitibano Paulo Leminski); na fotografia, na arquitetura,
na cerâmica (belas peças do sumiê e esculturas
de Kimi Nii), pintura, etc. Na mostra estão, por exemplo,
fantasias de carnaval e desenhos do desfile da escola Porto
da Pedra, que neste ano teve como enredo a imigração
japonesa; desenhos animados japoneses; o erotismo por meio
das gravuras Shunga e as fotografias contemporâneas
de Nobuyoshi Araki; a referência à tatuagem (irezumis)
nas obras de Adriana Varejão e Wakabayashi; o diálogo
dos bichos de Lygia Clark com os origamis.. . Há até
a Hello Kitty, simbolizando o pop e talvez o processo de despolitização
pós-Guerra - a única obra política da
mostra, segundo o curador, é o arquivo com a documentação
da ação polêmica que Yuri Firmeza realizou
em 2006 no Museu de Arte Contemporânea do Ceará,
quando criou a figura de um artista japonês fictício,
Souzousareta Geijutsuka.

Takaoka,
Yoshiya
Auto-retrato , dia e mês desconhecidos 1938
Óleo sobre tela
79,9 x 60,4 cm

Takaoka,
Yoshiya; Porto de Pesca - 1948
Aquarela - 61 x 63 cm

"O
Homem Amarelo" (1915 - 1916), óleo sobre tela
de Anita Malfatti

"Tatu"
(1961), de Anna Letycia

Trabalho
de Anita Malfatti, "O Japonês" (1915 - 1916)

Óleo
sobre tela sem título de 1967 de Tomie Ohtake

"Auto-retrato",
óleo sobre tela de 1950 de Flávio-Shiró

Xilogravura
"Guerreiro", de Marten De Vos

Fotografia
de Pierre Verger sem título

O diptico de Miguel Rio Branco, "Bola de Cristal Cega"
(2005)
Laços
do Olhar
Abertura:
20 de maio, às 20h (convidados)
Até
10 de agosto de 2008, de terça a domingo, das
11h às 20h - entrada franca
Instituto
Tomie Ohtake
Av.
Faria Lima, 201 (Entrada pela Rua Coropés) -
Pinheiros SP
Fone:
11.2245-1900 |
Fontes:
O Estado de S.Paulo, Camila Molina; UOL e G.A.
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